De necessidades dos clientes a metas concretas
- Pedro Ferreira
- 19 de dez. de 2021
- 5 min de leitura
Classificando as necessidades dos clientes e as traduzindo em metas concretas com o Modelo de Kano e Desdobramento da Função da Qualidade aplicados em um exemplo de Help Desk.
“Tudo começa com o cliente” - Louis V. Gerstner Jr
Resumo:
As cinco categorias de preferências dos clientes do Modelo de Kano são resumidas: qualidade obrigatória, quanto mais melhor, diferenciais, indiferentes e qualidade reversa;
Um Diagrama de Kano e uma Casa da Qualidade foram ilustradas para o estudo de caso de um Help Desk fictício;
Vimos como o Modelo de Kano nos ajuda a entender como nossos clientes são afetados por características específicas e depois como estes atributos podem ser posteriormente processados por ferramentas como o Desdobramento da Função da Qualidade (QFD) e traduzidos para metas mensuráveis que, se atingidas, deverão nos direcionar para um maior atendimento das expectativas dos clientes.
Boas mudanças que resultam em melhorias são normalmente as que reduzem custos, as que melhoram a qualidade e/ou as que de alguma forma aumentam as expectativas do cliente. As melhores mudanças são, naturalmente, as que abordam estas três dimensões. Logicamente não é nada fácil superar as expectativas dos clientes, com um diferencial, que normalmente se reflete no preço que estarão dispostos a pagar pelo seu produto. O primeiro passo para começar a trabalhar com este tema é identificar estes diferenciais.
Classificando a Voz do Cliente:
O processo de organizar as necessidades dos clientes e suas relações naturais já foi abordado em um texto anterior, com a ajuda dos Diagramas de Afinidades. Nós podemos usar esta mesma ferramenta para classificar estas “vozes” (por exemplo, através de votação) ou obter uma priorização diretamente dos clientes, por entrevistas ou workshops. Após esta classificação, poderemos então traduzir estas necessidades em requisitos mensuráveis.
Embora existam diversas métricas e abordagens para classificação das preferências dos clientes, uma forma simples e eficiente para começar tal análise seria utilizar o Diagrama de Kano. Este modelo de processar e classificar as “vozes” dos clientes foi desenvolvido pelo professor Noriaki Kano nos anos 80. Através deste modelo podemos identificar cinco categorias de preferências dos clientes:
Básico / Qualidade obrigatória / necessária – algo que é esperado. Seria como quando alguém nos diz que não fizemos nada além de nossa obrigação. Quando estes aspectos são atendidos, não devemos esperar alguma reação do cliente. Por outro lado, não atender esta demanda pode trazer um impacto negativo relevante. É como esperar pão com manteiga no café da manhã em um hotel.
Desempenho unidimensional – quanto mais, melhor. A satisfação do cliente aumenta ou diminui (proporcionalmente) conforme este atributo é ou não atingido. Diversas dimensões em serviços e na indústria seguem este padrão como, por exemplo: produtividade, custos e eficiência. Seguindo nosso exemplo do hotel: isto aconteceria com a variedade ou quantidade de itens oferecidos no café da manhã ou, para alguns, a quantidade de pão de queijo. Quanto mais, melhor.
Atrativos – diferenciais competitivos. A satisfação dos clientes normalmente não será afetada se não atendermos estas necessidades, já que elas não eram esperadas, mas se adicionarmos estas características em nosso produto ou serviço, os clientes serão positivamente surpreendidos. Seria, por exemplo, um café colonial com preço baixo. Não estamos normalmente esperando por isto.
Indiferentes – nem bom nem ruim. A satisfação dos clientes não é afetada de forma relevante caso este atributo seja atendido ou não. Em nosso café da manhã do hotel, isto poderia acontecer com os funcionários passando a utilizar uma comunicação altamente formal, por exemplo.
Reversos – depende do cliente. Quando superar o requisite pode resultar em uma insatisfação ou alguns clientes percebem a mudança de forma diferente. Seria como descobrir, ao chegar ao salão do café da manhã, que agora temos música ao vivo.
Considerando o exemplo fictício de processamento das necessidades dos clientes através de Diagrama de Afinidades do último texto, quando aplicamos o mesmo para um Help Desk, podemos ver na figura seguinte como classificaríamos as vozes no Diagrama de Kano. Poderíamos detalhar mais, classificando também diretamente os depoimentos.

Vale notar como os atributos mudam conforme o tempo e a região. Por exemplo: ter Wi-Fi gratuita era um diferencial no passado, mas hoje em dia é algo esperado em restaurantes e cafés; o câmbio automático é ainda um diferencial no Brasil, mas um requisito básico nos Estados Unidos; e pratos tradicionais são básicos nos seus países de origens e diferenciais em outros lugares.
Uma vez que entendemos estas classes, podemos processar os resultados de pesquisas com clientes e/ou de Diagramas de Afinidades relacionados, em um Modelo de Kano, para entender como os requisitos são afetados e como deveríamos aborda-los.
Traduzindo as vozes em requisitos mensuráveis:
O próximo desafio é traduzir estes itens subjetivos em requisitos concretos. Uma poderosa ferramenta para nos ajudar nesta tarefa é o Desdobramento da Função da Qualidade (Quality Function Deployment – QFD), também conhecido como a “Casa da Qualidade”. Ela traz uma forma visual de vincular o esforço do time de projeto com a Voz do Cliente. O resultado é uma tradução literal destas necessidades e suas priorizações para requisitos funcionais críticos. Ela pode também ser usada para outros processos de “tradução” como, converter estes requisitos em especificações técnicas do produto e posteriormente traduzir estas especificações de produto em especificações de processo.
Depois de listar as necessidades dos clientes, precisamos determinar a sua priorização, idealmente diretamente dos clientes ou através de uma escala (ex. ranqueando pelo Diagrama de Afinidades). Completamos depois a Matriz de Planejamento, onde nós medimos o desempenho nosso e dos competidores para estas necessidades. Posteriormente, nós identificamos os requisitos funcionais do produto ou serviço (normalmente os nossos especialistas já sabem quais são as típicas características que direcionam nossos produtos ou serviços). O passo seguinte é determinar as relações entre as necessidades dos clientes e os requisitos funcionais. Nós podemos, neste momento, calcular as prioridades para estes requisitos. Posteriormente, precisamos identificar as correlações técnicas (relações entre os requisitos). Depois de determinarmos os benchmarks competitivos com relação a estes requisitos técnicos, podemos definir nossas metas para os mesmos.
Um exemplo fictício para a Casa da Qualidade aplicado em nosso estudo de caso do Help Desk:

Conclusões
O Modelo de Kano nos ajuda a entender como nossos clientes são afetados por características diversas. Estes atributos podem ser posteriormente processados por ferramentas como o Desdobramento da Função da Qualidade (QFD) e traduzidos para metas mensuráveis que, se atingidas, deverão nos direcionar para um maior atendimento das expectativas dos clientes.
Em nosso exemplo, nós provavelmente concluiríamos que a nossa qualidade não era nosso maior desafio, mas sim a flexibilidade. Além de termos observado que os competidores desempenhavam melhor nesta dimensão, teríamos observado que os clientes a entendem como um diferencial. As prioridades seriam provavelmente um ajuste do tempo de resposta médio e redução da variação da taxa de resolução entre as células de analistas (ex. com análises de boas práticas e ferramentas de trabalho padrão do LEAN).