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Quando nossas crenças nos cegam dos fatos e dados

Alguns exemplos de como vieses cognitivos, pensamento de grupo e comunicação podem distorcer informações objetivas e nos levar a decisões com base mais em nossas crenças que em dados concretos.


“Às vezes, as pessoas não querem ouvir a verdade porque não querem que suas ilusões sejam destruídas.” - Friedrich Nietzsche.


Resumo:

  • Existem diversos tipos de vieses, além dos estatísticos, que estudamos dentro da metodologia Lean Six Sigma. Alguns exemplos foram aqui abordados;

  • Muitos dos vieses cognitivos podem adicionar subjetividade e nos afastar de dados e fatos;

  • A Escada da Inferência traz uma visão interessante de como nos afastamos das informações objetivas antes coletadas;

  • Precisamos sair da nossa zona de conforto, questionar máximas e considerar a possibilidade de que os resultados não são o que esperávamos.

Se você conhece Lean Six Sigma, você aprendeu que, além da variação de processo decorrente dos “5M’s” (Mão de Obra, Máquina, Material, Método e Meio), temos o sexto “ M ”que compreende a variação relacionada ao sistema de medição. Podemos usar ferramentas de Análise do Sistema de Medição para avaliar, entre outras características, o impacto do chamado viés estatístico. Dizemos que nosso sistema é enviesado quando nossas medições se encontram consistentemente deslocadas para um valor diferente. Portanto, o viés é uma métrica de quão longe nossas medições estão dos valores “verdadeiros”. Alguns exemplos são: uma balança que pesa consistentemente 2kg a mais que nosso peso real, um cronômetro atrasado, um auditor que é mais exigente que os demais ou apenas um dado que retorna uma probabilidade desigual de seus números quando é lançado.


Viés cognitivo e análises de dados


Além dos vieses estatísticos, os não tão distantes, vieses cognitivos também afetam nossa análise de dados. De acordo com Haselton et al., o viés cognitivo é um padrão sistemático de desvio da racionalidade no julgamento [1]. Esta tradução distorcida da realidade nos leva a conclusões equivocadas e, portanto, a decisões ruins. Existem vários tipos de vieses cognitivos e muitos deles podem comprometer diretamente nossa interpretação de resultados concretos.


Por exemplo, quando coletamos itens que não representam nossa população, isso pode estar ligado ao Efeito Halo (por exemplo, se assumirmos as primeiras unidades boas como nossa única referência) ou Viés de Confirmação (por exemplo, quando procuramos dados que confirmam nossas expectativas ou expurgamos dados que não as garantem).


Viés de comunicação e análises de dados


A comunicação naturalmente desempenha um papel relevante na forma como os dados são compreendidos e transmitidos. Além disso, como aprendemos em projetos Lean, processos com muitas interfaces são geralmente mais problemáticos. Aproximadamente um em cada cinco projetos falha devido à comunicação ineficaz [2] e o PMI (Project Management Institute) sugere que um gerente de projeto deve gastar 90% do seu tempo se comunicando [3]. Considerando a variação entre as partes interessadas, o como elas entendem as informações, e o quão preparadas estão para transmitir tais informações adequadamente, podemos imaginar o quão relevante é o risco de cometer erros no pós-processamento de dados e informações.


Erin Meyer traz bons exemplos e explicações sobre como nossa cultura muda a maneira como compartilhamos e entendemos as informações. Ela explica as diferenças entre as culturas de baixo e alto contexto usando, entre outros, os EUA e a Alemanha como exemplos para as culturas de baixo contexto. Nestas culturas, as mensagens são diretas, claras e precisas. Enquanto que em culturas de alto contexto, como países asiáticos, uma comunicação mais sofisticada é empregada e frequentemente as mensagens são implícitas, não expressas de forma clara. Por exemplo, a cultura e a comunicação brasileiras são muito mais contextuais do que a cultura alemã [4]. Em seu discurso, Ariano Suassuna, famoso escritor brasileiro, afirmou certa vez ter ouvido antes (sem detalhar a fonte), que quando um brasileiro é convidado para uma festa e responde “Eu irei”, essa pessoa pode ou não ir de fato, mas se a resposta for “Farei todo o possível para estar lá”, você pode ter certeza de que essa pessoa não irá. As informações são, portanto, transmitidas e interpretadas de forma diferente, a depender da cultura. Este processo pode, portanto, alterar o resultado de nossa interpretação dos fatos.


Efeito de Pensamento de Grupo


O pensamento de grupo ocorre quando o desejo de manter a lealdade ao grupo torna-se mais importante do que fazer as melhores escolhas [5]. É fácil imaginar como seus sintomas (ilusão de invulnerabilidade e unanimidade, crença na competência e moralidade do grupo, autocensura, proteção da mente contra informações negativas, visão distorcida dos “inimigos”, pressão direta sobre os membros do grupo..) afetam a forma como interpretamos os dados. A falta de discussões e o isolamento do grupo podem levar a uma visão distorcida dos fatos aumentam o viés.


A escada de inferência


Um conceito interessante para ilustrar como nossas crenças e expectativas interferem em nossas conclusões, mesmo que partamos de fatos e dados, é o da Escada de Inferência. Ele foi inicialmente desenvolvido pelo Dr. Chris Argyris e posteriormente apresentada no livro de Peter Senge, A Quinta Disciplina [6]. Nossa capacidade de cumprir nossos objetivos é prejudicada por nossa confiança em suposições como: nossas crenças são as verdadeiras e são baseadas em dados reais, a verdade está claramente declarada ou os dados que selecionamos são os verdadeiros.

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Conclusão


Todos os citados e outros efeitos humanos juntos são gatilhos para adicionar subjetividade em algo tão objetivo como a análise de dados. À medida que subimos a Escada da Inferência, estes vieses são gerados e, muitas vezes nos levam a decisões erradas, com base mais em nossas crenças que em dados reais.


Devemos manter uma abertura às diferentes informações e sempre considerar o risco de cair na armadilha de abordagens tendenciosas para, ainda, tomar melhores decisões. A melhoria só vem quando saimos de nossa zona de conforto e consideramos que os resultados podem realmente ser diferentes de nossas expectativas.


Referências


1 - Haselton MG, Nettle D, Andrews PW (2005). "The evolution of cognitive bias.". In Buss DM (ed.). The Handbook of Evolutionary Psychology. Hoboken, NJ, US: John Wiley & Sons Inc. pp. 724–746.


2 - ©2013 Project Management Institute, Inc. Pulse of the Profession In-Depth Report: The High Cost of Low Performance: The Essential Role of Communications, May 2013. PMI.org/ Pulse



4 - Meyer, E., “The Culture Map – Decoding how people think, lead, and get things done across cultures” pp. 37-41



6 - Senge, P., The Fifth Discipline Fieldbook. Doubleday, New York, 1994

 
 
 

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